Pedro Sakamoto, Pedro Escumadeira

Conheci o Pedro Sakamoto no meu primeiro dia de aula, na Escola Estadual Coração de Jesus, em São Paulo. Tínhamos 10 anos de idade, e tudo parecia novidade naquele universo diferente da minha realidade, pois acabara de chegar do interior do estado. Pedro, um garotinho branquinho, de pouco mais de um metro, cabelo preto escorrido e olhos de mangá, era conhecido como Pedro Escumadeira, e isto me intrigou.

Durante o meu primeiro mês na nova escola, fui observando mais detalhadamente o Pedro, garoto tímido, com uma cabeça redonda e desproporcional para seu franzino corpo. Filho de mãe japonesa com pai nascido no Piauí, o garoto tinha bochechas sem cor e com pequenos furinhos provenientes de espinhas precoces, de uma adolescência previamente anunciada. Entretanto, o que mais chamava minha atenção no Pedro Sakamoto, ou Pedro Escumadeira, era sua forma de falar. O Pedro espumava pelos cantos da boca quando falava, e isto me causava certo nojo, impedindo que eu me aproximasse deste diferente garoto, que trazia arquitetônicos bolinhos de arroz na lancheira. Este hábito, inclusive, o tornava ainda mais diferente da homogênea turma.

Quase ao final do ano, e ainda com o mesmo sentimento em relação ao Pedro, entendi o sentido do apelido Escumadeira ao presenciar minha mãe cozinhando. Na cozinha da minha casa a escumadeira, objeto circular côncavo, de aluminio, cabo de madeira e com furinhos, era um utensilio de uso diário que fui apresentado em uma manhã de domingo, quando minha mãe berrou para minha irmã mais velha: “Dalva, pega a escumadeira ai no armário e tira o excesso de espuma do arroz antes que derrame da panela”.

*Texto produzido a partir das aulas da oficina de “Comida & Literatura” – São Paulo / fevereiro, 2011  (www.oficinadeescritacriativa.com.br)

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